
O objetivo deste trabalho é entender como as audiências de custódia podem interferir nas prisões provisórias. Tais audiências foram implementadas no país em 2015 como um projeto experimental, com vistas a qualificar o processo decisório dos juízes. Desde o início, o objetivo era potencializar o uso de medidas cautelares diversas da prisão, com vistas a reduzir o quantitativo de presos provisórios, contendo as detenções às situações em que fossem estritamente necessárias. Com vistas a compreender se tais audiências têm, de fato, possibilitado mais decisões de liberdade do que de prisão preventiva, analisamos 4.374 decisões judiciais de processos de tráfico de drogas encerrados em 2019, sendo que em 2.505 foram realizadas audiências de custódia e 1.869 as decisões foram tomadas fora dela (no gabinete). Foram propostos três modelos de regressão logística binomial, tendo a variável resposta como a decisão de prisão ou de liberdade. Ao contrário da expectativa inicial, as audiências de custódia não aumentam as chances de decisões de liberdade, especialmente se a defesa for realizada por um advogado particular. Tanto na audiência de custódia como no gabinete, o principal fator que determina a prisão é o indicativo de participação em facção criminal. Por fim, o perfil do custodiado impacta de forma diferenciada nos dois contextos. No gabinete, os homens negros são os que têm maiores chances de prisão. Nas audiências de custódia, os homens desempregados têm maiores chances de prisão, o que mostra como o perfil da pessoa custodiada pode impactar na realização das audiências de custódia, com efeitos para a decisão proferida.